Violar o sigilo fiscal de qualquer cidadão é crime. Os responsáveis devem ser identificados, julgados e severamente punidos. Não importa qual seja a motivação ou a finalidade do ato praticado pelos meliantes. Ponto.
Feita a premissa, que nem seria necessária se não estivéssemos no calor de uma disputa eleitoral, o fato é que a novela dos dossiês sobre as declarações de imposto de renda de amigos e parentes ligados ao candidato José Serra virou o tema central da campanha presidencial no noticiário da imprensa nestes últimos dias.
Desde junho, quando surgiram as primeiras denúncias da quebra do sigilo fiscal de Eduardo Jorge, vice-presidente do PSDB, até o capítulo mais recente, que envolve Verônica Serra, filha do candidato, atribui-se a responsabilidade ao PT e à campanha de Dilma Rousseff.
Mas que misteriosos dossiês são estes? O que eles contêm de tão grave que possam influenciar o eleitorado? O que estes dossiês escondem que a gente não possa saber?
Até o momento em que escrevo, no meio da tarde desta quarta-feira, tudo é muito nebuloso, mal contado, esquisito. Sabemos agora que o sigilo de Verônica Serra foi quebrado por um contador que usou procuração falsificada, em setembro do ano passado, quando o quadro das candidaturas presidenciais nem estava definido.
Mesmo que estivesse, e que esta sandice tenha sido praticada por alguém ligado ao PT, que vantagem a campanha de Dilma levaria ao fazer um dossiê com dados fiscais de pessoas que a grande maioria da população nem conhece, nunca ouviu falar? Se alguém faz um dossiê, imagina-se que seja para divulgá-lo com o objetivo de prejudicar o adversário. Em algum momento isto foi feito?
Por que esta história só surge agora, na antevéspera das eleições, no momento em que todas as pesquisas eleitorais mostram ampla vantagem de Dilma Rousseff sobre José Serra, com possibilidades de vencer no primeiro turno? Quem ganha com isso?
O que leva a maior rede de TV do país a dedicar um terço do “Jornal Nacional” unicamente a este assunto, como se fosse mais um anúncio do fim do mundo?
Tudo faz lembrar o chamado “escândalo dos aloprados”, mais ou menos neste mesmo período da campanha eleitoral de 2006, quando pessoas ligadas ao PT foram acusadas de comprar um dossiê com denúncias contra tucanos. Até hoje ninguém sabe o que continha o tal dossiê, que só serviu para levar a reeleição de Lula para o segundo turno.
O único efeito prático do atual caso, até agora, foi ter dado um discurso a José Serra. Num encontro com prefeitos na noite de terça-feira, em São Paulo, o candidato da oposição mandou bala: disse que Dilma era uma “fraude”, acusou o PT de “sordidez” e chamou seus militantes de “fascistas”.
Para ele, o governo é uma “máquina partidária que ameaça e persegue as pessoas evidentemente a serviço de uma operação político-partidária e eleitoral”.
A aliança de Serra pediu no mesmo dia ao TSE a cassação do registro de Dilma. A direção do PT também decidiu entrar na Justiça para processar José Serra por acusações caluniosas. A candidata, por sua vez, chamou o tucano de “leviano” por cometer “calúnia para levar vantagem eleitoral”.
Do lado de fora, sem entender muito o que está acontecendo, o eleitorado acompanha os acontecimentos e só espera que a eleição presidencial não seja decidida no tapetão.
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